A festa do Carnaval aponta para tempos remotos, muitos
séculos antes do surgimento e da hegemonia da religião cristã no ocidente.
Estudiosos afirmam significados diversos para a palavra, mas um consenso diz
que o Carnaval era a celebração da época de colheitas no hemisfério norte e, em
tom de alegria e festejo, as pessoas saíam às ruas para comemorar a fartura e o
êxito dessas colheitas, que garantiriam os suprimentos necessários para as
demais estações dos anos. Num universo politeísta, a festa era um modo de
agradecer aos deuses pelo bom fruto das sementes.
Já na era cristã, o carnaval antecedia a Quaresma, período em que se abolia o
uso da carne e práticas de jejum e interioridade (oração) eram incentivadas
como modo de se viver a fé. De origens bíblicas, essas práticas, junto com a
prática de doar esmolas aos mais empobrecidos formavam o tripé da
espiritualidade quaresmal.
Como resgatar o sentido dessas práticas no mundo contemporâneo? Hoje, falar de
jejum e esmolas parece algo antiquado e mesmo equivocado – esmolas são mal
vistas, quando consideradas como mero assistencialismo que não promove uma
transformação autêntica de vida para os empobrecidos, que lutam por uma vida
digna e condições materiais justas para viver (moradia, saúde, alimentação).
Hoje, a cultura moderna valoriza práticas e ações que deem sentidos à vida,
para além dos formalismos ou repetições rituais e mesmo doutrinais. Importam as
ações que atendam ao desejo e necessidade de realização e felicidade, mesmo
quando não sabemos ao certo o que sejam esses conceitos. A modernidade, e nela
especialmente a juventude, é surpreendentemente aberta à solidariedade: os
jovens gostam de participar de campanhas, voluntariado, ações de cunho social e
promoção da dignidade humana. Há uma “sede” do infinito, do transcendente,
enfim, de Deus, mesmo que não se vincule necessariamente esse desejo a uma
vivência comunitária ou institucional (igreja). E somos marcados por uma
cultura festiva, festeira: mesmo conscientes de nossas mazelas, festejamos e
confraternizamos, partilhando e vivenciando momentos de humor e companheirismo,
resgatando tradições, músicas e costumes de nossos antepassados (vide o
ressurgimento e popularização das marchinhas de salão). Muitos viajam, tem um
contato maior com a natureza, o campo, paisagens às quais nos distanciamos no
cotidiano de nossas cidades.
Que possamos, enfim, beber nas fontes originais dessa festa, resgatando a
gratidão pelos bons frutos do nosso trabalho, reconhecendo nele não apenas a
realização de projetos pessoais, mas também sua contribuição para a vida e o
crescimento das pessoas; vivenciando uma espiritualidade que nos alimente a
vida interior, ao mesmo tempo em que nos estimule à generosidade e à
solidariedade com o próximo.
E, como muitos dizem que no Brasil o ano só começa mesmo após o carnaval, que
tenhamos todos um 2014 pleno de realizações, alegrias e generosidade, com o
coração aberto para um ano que exigirá de nós muitos esforços, mas nos
oferecerá, por contraparte, a oportunidade de criarmos coisas novas, belas e
que preencham de sentido a nossa vida.
Bom Carnaval a todos!
Muita alegria, descanso
e lazer!
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