“Aquele que transforma as palavras em verso transforma-se em poeta.
Aquele que transforma o barro em estátua transforma-se em escultor.
Ao transformar relações sociais e humanas em cena de teatro,
[o ator] transforma-se em cidadão”.
(Augusto Boal)
Viver é relacionar-se:
condição humana fundamental! Conviver com o outro é o campo em que
forjamos o que somos: caráter, personalidade, valores, potencialidades e
limites. A convivência é o lugar da realização humana: nela se
estabelecem os conflitos e as tomadas de decisões. O modo como lidamos
com isso lapida aquilo que somos.
Tomar consciência dos
conflitos e das decisões com as quais lidamos nos possibilita uma
passagem: a de meros espectadores das tramas da vida para a de agentes
transformadores da vida! Essa passagem torna-se autêntico ato político,
libertador, educador!
Mas como proporcionar essa
passagem? Muitos pensadores, pedagogos, intelectuais e cidadãos
dedicaram suas vidas a isso. Augusto Boal, artista e diretor teatral
brasileiro propôs um método criado por ele chamado de “Teatro do
oprimido”: por meio de esquetes e cenas teatrais, ajudar as pessoas a se
reconhecerem nas situações vividas e refletir a respeito, por meio do
diálogo e da troca de ideias. Essa reflexão ajuda a florescer a
consciência de que podemos ser “agentes de transformação”, e que a vida
não “tem” que seguir um script determinado, e que há espaços para mudanças e outras formas de lidar com os conflitos.
Essa experiência foi
vivenciada pela turma do 9º ano D (na quarta-feira, dia 17/09), a partir
de uma ótica muito específica: a do bullying como forma de relação opressora no meio escolar. Organizados em três grupos, os alunos prepararam cenas em que o fenômeno do bullying
se apresenta como elemento conflituoso nas relações dos jovens
estudantes. Encenar tais situações proporcionou algumas reflexões e
sentimentos interessantes, manifestados pelos alunos. Primeiro: o
desconforto em reconhecer momentos em que uma pessoa é diminuída em sua
autoestima por meio de zombarias ou rótulos desrespeitosos. Depois, a
consciência de que é preciso romper com os elos e relações repressoras,
proporcionando espaços de liberdade de expressão – romper com os
silêncios, enfim. E, sobretudo, entender que as relações se constroem e
se refazem a cada dia: mesmo quem é alvo de bullying pode e deve reverter essa condição, por meio do “encorajamento”, iniciativa e diálogo no espaço da convivência escolar.
Esse trabalho é um ponto de
partida para os alunos amadurecerem a consciência de que todos são
cidadãos no âmbito desse espaço e, portanto, merecedores de respeito e
consideração. Dar vazão aos sentimentos de quem é alvo ou quem pratica o
bullying é uma experiência surpreendente: florescem atitudes
de solidariedade dos outros colegas, que comungam de ideais e atitudes
de respeito e senso de acolhida e de diálogo entre eles. Importante
também é evitar o revide ou julgamento precipitado da parte de quem
causa a opressão: ouvi-los em suas inquietações e experiências é muito
importante, mais até que simplesmente punir ou reprimir – criam-se assim
condições para todos amadurecerem como sujeitos autônomos e
responsáveis na escola e na sociedade em que vivem.