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segunda-feira, 5 de agosto de 2013

PERDIDOS e ACHADOS: o que é mesmo que perdemos?



Há algum tempo venho observando a “arara”, ou cabide, onde são pendurados os objetos encontrados e que aguardam seus donos. De uma forma bem empírica, três detalhes me chamam a atenção neste suporte: primeiro, o aumento do número de objetos perdidos; segundo, o aumento do valor e a diversidade de objetos ; terceiro, que a procura pelos objetos perdidos vem diminuindo.

Talvez menos de uma década atrás, se um estudante perdesse um agasalho, antes de voltar para casa ele já estaria correndo atrás. Isto porque, ele só tinha aquele, o próprio, o único “agasalho de ir para a escola” ou por medo da reação da mãe ou do pai. Perdeu? Vai ficar sem, até encontrar! Era assim e ponto final.

Hoje é muito diferente. São vários os agasalhos. Um a mais ou um a menos não irá fazer diferença. Poucos sentem falta e, menos ainda, têm o interesse ou se dão o trabalho de recuperar. O sujeito que perdeu, o estudante no caso, nem participa desta história. Isto é problema da mãe ou da avó. Talvez pela facilidade em comprar um novo. Perdeu, compra outro. Subtexto? O dinheiro recupera a falta.

Outro aspecto importante, coisa de cinco anos atrás, é que não se levavam para a escola “objetos de valor”, pois somente os adultos os possuíam. Trabalharam, deram duro para conseguir tais objetos; sinal de distinção. Hoje, criança com menos de dez anos de idade tem iphone, celular de “última geração” (se é que existe isto), relógio com todas as funções, mochila, tênis, maquiagem... tudo de “marca”.

Considero que a tal da “arara” está lá para falar também de nós. Podemos ler em sua imagem que o desejo que deveria mover as crianças e os jovens a lutarem para ter ou conseguir algo, não é desenvolvido e nem mais necessário. Antes que venha o desejo, o objeto está nas mãos. Com a mesma facilidade que chega, ele vai. Como não houve esforço para conquistá-lo, e muito menos necessidade, não há sofrimento pela sua ausência. Perdeu, compra outro.

Quando criança lembro que no Natal o presente era “estrategicamente” o sabonete, o estojo, o caderno, a meia e outros objetos indispensáveis para a higiene pessoal ou para a vida escolar. Estavam relacionados à utilidade. A pergunta era: você está precisando? É necessário? Lembro, como se fosse hoje, da dificuldade e de quantos dias (talvez semanas), precisei negociar com meus pais para ganhar um “bambolê”, brinquedo que estava na moda. Foi assim também com a tal da “tartaruguinha” (naquela época ainda achava que animal era coisa, igual a uma cadeira!). Aquele mundo era, sim, desprovido de muitos objetos, porém não acompanhado da ideia de escassez ou sinal de pobreza. Mundo nada “cor-de-rosa”, mas rico na pedagogia de talhar caráter e no ensino sobre o valor de cada coisa.

Este registro pessoal pode entrar para a galeria dos registros históricos (“naquele tempo era assim...”). Que assim seja. Contudo, não podemos negar que, apesar do excesso de objetos que carregam as “araras”, não ficamos “mais ricos” de experiências, nem mais felizes, e nem mais plenos. O contraponto pode estar na pergunta: em que medida, aquilo que me re(veste), e que possuo, fala de mim? Quantos agasalhos, sapatos, bolsas, mochilas, carros etc. eu preciso “para encher o que tenho de fundo”?


Aleluia Heringer Lisboa Teixeira

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